sábado, 1 de fevereiro de 2014

a partida.



Chove.
Os lábios frios, rubros de batom pintado com fruta madura amassada.
Os olhos carregados, brilhantes, como brilhante é a lua na noite escura.
Tez pálida, carregada com linhas de dor e de esperança em igual medida.
Peso de uma vida, leveza de uma pena.
Vento em rajada assente a ferro e fogo no peito
Em turbilhão no regaço da saia
Os sonhos e os pesadelos de uma outra vida
Que pesa menos em existência e mais em desejo
Do que aquela que corre nas veias
Pés feitos de pó, traçados de vontade de rasgar caminhos
De descobrir outras gentes e outras terras
Ditam projectos encarcerados em linhas remotas no tempo e na memória
Em qualquer folha de papel gasta, amarrotada, pelos anos, pelas angústias
Definhadas por império de uma outra vontade, de uma qualquer circunstância.
Braços abertos para reter o mundo, a abraçar o vazio
O vazio da mente, o vazio da história
Da história que não foi vivida, que nem foi pensada
Mas que se desejou intensamente
Como o mar deseja a enseada e O inverno chama a primavera
Chove.
Um estado de chuva permanente,
Sem saber se são lágrimas de solidão e morte
Ou lágrimas de risos
Risos ecos nas paredes brancas
Caiadas lá de casa
Da casa desabitada da infância
Minha e tua
Irmãos de mãos dadas,
Separados, reparados
Estilhaçados
As palavras que se dizem
Só pelo olhar
Não te espero na partida
Sigo a vida de costas viradas, para não te ver ir
Sei que regressarás
Talvez já não chova.
Talvez eu já não seja a mesma.
E tu também não.
E talvez, só talvez voltemos juntos àquela casa de paredes caiadas de branco.



domingo, 13 de janeiro de 2013

Se me pudesses ver agora.


-Sabes o que quero?

-Não. O que queres?
-Quero a tua gargalhada mais pura e mais perfeita!
...
-Havemos de ser felizes?
-No silencio seremos. As nossas vozes inaudiveis irão permanecer para sempre.
- A pairar?
- A suspirar. Seremos sempre suspiro.
- Não podemos ser grito?
- Podes ser o que quiseres. Não te limites.
-Então quero ser pássaro.
-Mas isso tu já és.
-Então porque não sinto?
- Porque ainda ninguém pintou o mais perfeito céu para ti.
-Quando me lançar, voas comigo?
-Não posso.
-Porquê?
-Porque quero ficar cá em baixo a contemplar-te.
-E se eu cair?
-Se tu caíres estenderei os meus braços e agarrar-te-ei.
...
-Embalas-me?
-Todas as noites.
-E se eu acordar deste sonho?
-Meu amor, isto nunca foi um sonho. Agora dorme.
-Amanhã quero ouvir-te rir.
-A minha gargalhada mais perfeita?
-Sim. Assim havemos de ser felizes.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Os sonhos.




Chega-se a ser grande, não por desistir ao primeiro embate, mas por persistir, mesmo quando todos nos dizem que somos loucos.
Talvez invejem a nossa loucura, ou simplesmente a nossa coragem.
Porque é preciso ter coragem para não desistir e continuar.
É preciso perder horas a tentar, e a tentar, e a tentar.
Nós temos o dever de sermos a melhor versão de nós mesmos. Temos o dever de ser muito mais do que sonhámos, idealizámos ou acreditámos ser. São os nossos sonhos que estão em causa. É toda a história da nossa vida que ainda não foi escrita.
Não sejamos pois medíocres, pensando apenas no que é preciso fazer para sobreviver apenas a mais um dia.
Sejamos rebeldes, sejamos fiéis aos nossos princípios, aqueles que sabemos ser bons, serem dignos, serem justos. Mesmo que para isso tenhamos de abdicar da possibilidade de sermos importantes, ou famosos, ou ricos, ou simplesmente alguém que não nós mesmos.
Aceitemos que vamos tremer de medo às vezes. Que vamos ficar encurralados às vezes, mudos às vezes, esgotados às vezes.
Aceitemos que não há nada de errado com isso. Faz parte do caminho que temos de trilhar.
Que sejamos sinceros, mesmo que isso implique que no fim fiquemos a perder. Porque se formos verdadeiros, a perda não será de facto uma perda, mas a melhor forma de ganhar carácter.
E amemos. Amemos muito. De todas as formas. Com conteúdo. Amemos honestamente, claramente, simplesmente.
Porque se um dia nos tirarem tudo, ainda assim, o livro eterno das memórias continuará a ser desfolhado na nossa mente e o nosso coração continuará a bater, como batem as asas de um pássaro, no nosso peito.
Por isso, se tiverem um sonho, um desejo, um pedido, que este seja a estrela no vosso céu, o vosso avião para voar, a vossa vela aberta ao vento, a vossa luz acesa na escuridão, o vosso guia, o vosso lema, a vossa consciência. Que ele vos faça grandes, melhores, únicos e maravilhosos. Dignos.
Se tiverem um sonho, repitam-no em silêncio todas as vezes que vos parecer impossível e verão como ele vos ajuda a encontrar respostas.
Se tiverem um sonho, será ele que vos levará ao fim, á meta, ao limite, a ser aquilo para o qual nasceram.
Por isso, pensem bem no vosso sonho. Guardem-no no lugar onde ele vos possa dar alento.
Um dia ele será apenas mais uma verdade na vossa vida. Mas será certamente a maior verdade.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

aquarela pintada a saudade.


Talvez nem tudo esteja perdido.
Réstia de luz, réstia de paz.
Porque mesmo que me afunde sentirei sempre o meu coração a bater corajosamente.
Larguei a vela. Se sei para onde vou? Não...
Desta vez não serei eu a ditar as ordens ao leme. Não exijo, nem reclamo.
Sinto-me cem anos mais velha,mais gasta, mais cansada e apagada... querendo agarrar somente a infância perdida nos cantos do tempo e da vida, varrida pelos ventos da saudade para algures ( será que a infância te deu a mão e ficou contigo quieta, parada há muito tempo atrás avô?).
Sento-me de pernas cruzadas e olhos fechados, como quem ora, como quem chora, como quem espera, como quem aceita.
E no meio da fragilidade e duvidas deste tempo cinzento e estranho que tem cismado em entoar na minha vida,  eu aceito.
Simplesmente.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Preludio.


Os sons ritmados fluem no ar.
Canela e mel.
Terra molhada nos pés.
Esta sou eu.
Infantil. Desconcertada.
Beijada do sol.
Sou eu.
Arrebatada pelo mistérios da (re)descoberta do amor.
Prelúdios.
Todos os meus dias são prelúdios.
A luz treme-me nos olhos.
Sou assim.
Adoravelmente embriagada de vida.

sábado, 7 de janeiro de 2012

acordes.


Acordes baixos…
Acordo.
São estranhos estes sonhos com que tenho sonhado.
Não entendo o porquê de tudo ser como é, mas aceito.
Aceito a paixão de recomeçar novamente.
A paixão de acordar e te escutar, também tu novamente acordado
Tocando acordes.
São pêssegos maduros, é mel e canela.
São raios de sol.
E vento na vela.
Esses acordes.
São lugares, são momentos, são segredos
Que me segredas só a mim.
Nos entardeceres e amanheceres (irre)quietos
Em que de novo encontramos o nosso lugar.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Perfect days.


Os dias perfeitos,
Vistos pela visão de quem admite a simplicidade
Das coisas pequenas do dia-a-dia
Os dias com os mesmos contratempos de todos os outros
As mesmas angústias
As mesmas dúvidas e questões.

Mas são os dias perfeitos
Os dias das flores,
Dos livros,
Os dias da chuva morna, das amoras quentes do caminho.

Os dias das chaves perdidas das gavetas ,
E das manchas de tinta por todo o lado.
Os dias dos chás perfumados e das árvores antigas a fazer sombra fresca.
Dos cadernos empoeirados, das receitas antigas da avó.

Os dias das conversas de muro,
Da música agradável.
Até entre paredes a descascar e escadas a ruir.
Porque há beleza, em quem deseja ver.
Em quem consegue sentir
A grandeza da vida,
Escondida,
Qual tesouro ,
Entre os espaços das palavras caras
E da solidão.

Entre o sofrimento de cada dia
Existem momentos de pura alegria.
Os momentos dos dias perfeitos
À espera de serem descobertos e vividos.
Por quem se digna a tentar.
Todos os dias.